AINDA HÁ ALGO A SER SALVO! Sobre a proteção climática e poder dos passos dos pequenos

Caros irmãos e irmãs, paz e bem!

O calor (global) está aumentando, mas também o ardor ecológico, graças a Deus. Creio que, como guardiões e guardiãs da Casa comum, estamos sempre dispostos para aprender e atualizar a caminhada e o aprendizado quando se trata da ecologia integral; ainda mais nestes dias, um passo distante à COP 30 em Belém.

Confira a entrevista com Ottmar Edenhofer (1961), publicada na revista alemã PUBLIK-FORUM (20/06/2025, p. 12-18), que é o diretor do Instituto de Pesquisas Climáticas em Berlim/Alemanha, professor da Economia e Política de Mudanças Climáticas na Universidade de Berlim e coordenador do Conselho Europeu do Clima.  

 Embora, a leitura de textos (longos) esteja fora de moda e costume, mas é uma das melhores maneiras de adquirir novos horizontes e energias! 

(Origem das fotos: 1ª arquivo próprio; 2ª e 3ª Google Imagem.)


Há 10 anos, a Encíclica ambiental ‘Laudato sí’ foi publicada.

O economista climático Ottmar Edenhofer participou na elaboração da mesma, como também do Acordo de Paris em 2015. O que ficou das esperanças?

1ª Pergunta: Há 10 anos atrás, a comunidade mundial se comprometeu a limitar o aquecimento global por 1,5º C, e o Papa Francisco publicou a Laudato sí. Parecia que a preocupação com o clima ganhava a devida atenção. O senhor participou na preparação dos dois documentos. Como vivenciou aquele tempo?

Resposta: Aquele tempo foi intenso e decisivo. Um ano antes, em 2014, eu tive que preparar a plenária do Conselho Mundial do Clima; o objetivo era de apresentar um resumo das pesquisas científicas para o Acordo de Paris. E exatamente na mesma semana recebi uma solicitação do cardeal Turkson pedindo que viesse imediatamente a Roma para conversar. Não foi possível. Mas, depois falei longamente com Papa Francisco e enfatizei uma questão muito relevante: Temos que considerar o clima como um “bem comum da humanidade”. A atmosfera não pode ser mais usada como um lixão no qual todo mundo joga impune e incontroladamente seu lixo CO². 

2ª Pergunta: E a Encíclica acolheu essa questão?

Resposta: Essa frase consta no número 23 da Laudato sí; porém, o assunto não foi muito abordado. No entanto, considero essa questão do “bem comum da humanidade” a chave de compreensão para tudo.

3ª Pergunta: O senhor ficou surpreso pelo fato que o Vaticano se interessava de repente pela ecologia e a questão climática?

Resposta: Nós já organizávamos encontros no Vaticano para refletir a respeito da conexão entre o clima e a pobreza, tendo a MISEREOR como parceira. Os bispos do Sul global sempre diziam: a mudança climática é uma realidade para nós que vocês não devem tratar apenas “nas considerações finais”. Mas, isso não era uma opinião majoritária na Cúria. No tempo do Papa Bento XVI, a Igreja estava muito reservada diante dessa questão. O argumento era que não haveria ainda um consenso científico e, por isso, seria melhor esperar mais. Além disso, o combate à pobreza seria mais importante do que a proteção climática. E houve muito medo que em consequência da temática dever-se-ia também falar sobre a superpopulação e, com isso, sobre a política populacional e anticoncepcionais; naquele tempo, um tema absolutamente tóxico para a Cúria. Aos olhos de muitas pessoas, a proteção climática era um projeto das elites loucas, liberais, urbanas, das quais não se pode esperar muito, segundo o ponto de vista do Vaticano. O cardeal australiano, Pell, era um negacionista ferrenho da mudança climática. Também no Secretariado de Estado, poucos se interessavam – com uma exceção: Pietro Parolin, que Francisco nomeou posteriormente como Cardeal Secretário. Ele escutava atentamente e fazia perguntas sábias.

4ª Pergunta: No entanto, a fé na criação poderia ser uma ponte, também para cardeais com pensamentos conservadores ou tradicionais.

Resposta: De fato, essa fé criacional é uma ponte! Mas, aqui não se trata de um pouco de proteção ambiental ou um pouco de renúncia, e sim, trata-se de um problema humanitário que exige gigantescas intervenções no sistema terrestre. Se queremos baixar a curva de temperatura e, a partir do segundo semestre do século, alcançar uma emissão negativa, isso não funcionará sem uma técnica que absorve o CO² da atmosfera e o armazena no subterrâneo.  

5ª Pergunta: Papa Francisco comparou uma de suas ideias centrais – o comércio das emissões – como negociar indulgências. Ele exige que os países ricos aceitam uma diminuição de sua economia. 

Resposta: O comércio deve remunerar aquele que contribui para a redução das emissões com menos custos. Não está bem claro o que o Papa critica: ou deve-se baixar mais rápido o limite superior, ou ele condena o comércio? Como muitas outras Encíclicas, também a Laudato sí oscila entre reformas estruturais e imperativos éticos. Isso deriva do fato de que a Igreja católica não respondeu claramente algumas perguntas fundamentais: Como ela se comporta diante do mercado, da democracia e do capitalismo. Por outro lado, a Laudato sí tem uma postura clara em muitos pontos, por exemplo, que precisamos do princípio do ‘causador’. 

6ª Pergunta: As reações à Laudato sí oscilaram entre entusiasmo e acusação de ingenuidade.

Resposta: Recebi muitos telefonemas de colegas, entusiasmados pela inserção dos fatos científicos num documento doutrinal-religioso. Com isso, o Papa Francisco teria acabado a guerra entre religião e ciência. A revista Nature Climate Change, a publicação mais importante para a pesquisa climática interdisciplinar, dedicou uma edição especial à Encíclica. Eu considero isso um acontecimento único na história moderna das ciências.


7ª Pergunta: Hoje, 10 anos depois, qual é o seu balancete?

Resposta: Três meses atrás, eu teria dito que “o assunto murchou”. Embora a diplomacia vaticana tenha sido eficaz como nunca antes junto ao Acordo de Paris devido a sua solução de bloqueios e sua mediação, e embora Francisco tenha pronunciado uma palestra forte na ONU, pouco depois não aconteceu mais muita coisa. Agora, com a mudança no pontificado, estou enxergando uma chance que a causa vai ganhar um novo dinamismo. Logo após sua eleição, Leão XIV disse que os cientistas e os peritos em ética social deveriam refletir sobre a conexão entre dívida ecológica e o endividamento estatal. Trata-se da questão que os países ricos reduzam sua dívida ecológica. Dependerá do Papa Leão XIV, se no final a Laudato sí marcará uma mudança histórica de consciência ou se entrará como um episódio na história da Igreja.  

8ª Pergunta: A Igreja católica fez o dever de casa?

Resposta: Creio que as Igrejas sentem instintivamente que o tema é grande demais para elas causando uma sensação de impotência. As Igrejas não estão contra o tema, mas domina uma certa “calmaria”. A isso acrescenta-se a divisão interior; pois para a ala do catolicismo crescente da Direita, a mudança climática continua não sendo um tema. 

9ª Pergunta: As Conferências Climáticas também causam uma sensação de impotência.

Resposta: O limite dos 1,5º C iremos ultrapassar durante décadas. Não será mais possível manter o limite constantemente; e estamos muito distantes da saída das energias fósseis. A Amazônia, a maior reserva de biodiversidade do mundo, está diante do colapso. Essas são más notícias, e sempre esperamos a grande virada a partir de uma COP. Essa não virá. Mesmo assim, as COPs são importantes para realizar os pequenos e pragmáticos, mas sustentáveis acordes; se for necessário, também sem os EUA.

 

10ª Pergunta: Seus planos pressupõem várias coisas; como, por exemplo, a vontade da população, um forte Estado que promulga as leis, uma justiça independente que vigia a observância e evita abusos. Mas, são exatamente essas instâncias que estão sendo atacadas.

Resposta: Nós presenciamos não somente o ataque contra a democracia, mas contra as funções elementares dos serviços públicos. No palco internacional, alguns países brigam para aumentar seu poder geopolítico. Mas, eu não pressuponho nenhum altruísmo: neste contexto, a União Europeia faz bem em reduzir e diversificar suas importações de petróleo e gás. Com isso, a caixa militar do Putin ganha menos.

11ª Pergunta: O medo de perder o bem-estar empurra em todo mundo os populistas e nacionalistas para os cargos políticos. O aumento dos preços de energia é quase um presente eleitoral para eles.

 Resposta: Nós temos que entender que o Estado nacional tradicional, por si mesmo, não pode cumprir sua promessa de segurança dentro de um mundo globalizado; isso funciona somente através de cooperações internacionais. Nossas pesquisas mostram que para os países industrializados seria economicamente rentável de ajudar no financiamento da saída do carvão no Vietnã ou na África do Sul, pois com isso poupa-se danos climáticos. A mudança climática desenfreada é um risco fundamental para o bem-estar, tanto para nós como para o Sul global.

 12ª Pergunta: Estamos iniciando o verão mais quentes na história da humanidade. Haverá incêndios florestais e chuvas fortes, mas não haverá uma redução das emissões ou das viagens aéreas. Catástrofes naturais influenciam o comportamento das pessoas?

 Resposta: A maioria das pesquisas mostra que “o choque como faísca inicial” não funciona para uma ação apropriada. Creio que as pessoas só se envolvem em cenários de perigo, quando tiverem a sensação que há uma saída, uma solução. É como a gente quisesse transformar um obeso num corredor de maratona. Isso não funciona de hoje para amanhã, nem com ameaças. Precisa-se de um plano de treinamento.  

 13ª Pergunta: O problema está sendo suprimido?

 Resposta: Após o Acordo de Paris houve um amplo movimento global pela implementação de políticas climáticas. Nós analisamos 1500 instrumentos políticos em mais de 40 países: Quais provocaram uma ruptura estrutural na redução de emissões? Afinal, ficaram apenas 63 projetos. Algumas pessoas comentam que isso é muito pouco. Mas, na minha opinião, o número é fantástico, pois podemos aprender muito. Muitos países conseguem a redução de suas emissões.

 14ª Pergunta: Há tempo suficiente?

 Resposta: Já perdemos muito tempo dizendo toda hora que não temos mais tempo. É mais importante usar o tempo disponível para planejar e aprender. E vale a pena lutar para que o aquecimento seja limitado dentro de 1,6 ou 1,7 ou 1,8 graus. 

15ª Pergunta: E para conseguir isso, qual é a relevância da disposição de fazer renúncias?

Resposta: Essa pergunta tem duas dimensões que facilmente estão sendo confundidas. A primeira: Será possível desligar o crescimento econômico do aumento das emissões? Eu digo que sim, ao menos nas próximas décadas. A segunda dimensão é: Há além da renda outros bens que são mais importantes para nós? Muitas pesquisas mostram, que a renda e o consumo ao menos se correlacionam com a felicidade. Eu não vejo a disposição para uma grande renúncia a renda, nem em nível nacional nem internacional. Por outro lado, tampouco creio que seria suficiente emitir leis ou oferecer estímulos financeiros. Precisamos ambos: a motivação intrínseca para fazer o bem e condições estruturais adequadas. Através de uma experiência socioeconômica mostramos que um preço (imposto) pelo CO² pode fortalecer a motivação altruísta: quando vejo que reduzo as emissões através do meu comportamento, mas todos os outros não fazem o mesmo, isso arruína minha motivação. Mas, quando vejo que os outros hão de fazer a mesma coisa, aí estarei até disposto a fazer mais do que deveria.


16ª Pergunta: O cenário dos partidos políticos muda, os sistemas políticos ficam cada vez mais instáveis. Não estamos preparados suficientemente para isso. Algo semelhante vale também em relação ao clima?

Resposta: Por isso, é muito importante mostrar caminhos de resiliência que podem ser tomados em meio de um grande perigo, sem perder a esperança. A esperança consiste em guardar um ‘senso de possibilidade’ de poder remar rumo a um outro mundo. Sem o “senso de possibilidade” não há um “senso de realidade”.

Pedido do tradutor Frei Johannes Gierse:

É com muito amor e esperança que fiz a tradução desta entrevista para você!

Agora, você vai retribuir enviando para mim a ressonância:

O que achou interessante? Onde você se “encontra”?


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