PARADISING – O PARAÍSO COMO MISSÃO

PARADISING – O PARAÍSO COMO MISSÃO


 

Paradising é uma palavra inglesa (gerundium) e significa: fazer o paraíso. Para a língua portuguesa poderíamos inventar uma nova palavra: paraisofazer, ou paraisofação, que quer dizer: o paraíso como tarefa, como uma missão.

 

Paradising descreve a ideia de que a terra é nosso único habitat e que, com ela, uma abordagem diferente é concebível, possível e implementável do que aquela que se vive atualmente. Eis um impulso para a emergente transformação da relação entre a pessoa humana e a natureza.

 

 Como compreendemos de novo o antidoto céu e terra? Como se relaciona o paraíso celestial dos anseios humanos com as possibilidades – embora sejam em boa parte paradisíacas - da existência terrestre? E como nos concentramos para que a imagem do paraíso motiva, de um lado, a meditação e a reflexão, de outro lado também a ação?

 Em nossos dias, o apocalipse e o paraíso são como dois países vizinhos. Um é o país do ocaso, o outro é o país das possibilidades, da salvação. Nós seres humanos transitamos entre as fronteiras desses países. Algumas coisas se tornam perceptíveis que antes ficaram ocultas. A luz e a verdade iluminam os cantos escuros de nossa vida. Na nossa cultura do descuidado divulga-se as notícias referente à crescente destruição e exploração, notícias referente ao aquecimento global, á perda da biodiversidade, à guerra pelo poder e a escassez dos recursos com as outras notícias comuns. Nossa atenção está dispersa de todas as maneiras possíveis. Ao mesmo tempo, muitos podem e querem recomeçar e não fechar mais os olhos – referente à própria vida e a da sociedade.

 E assim, o engajamento por um mundo ecologicamente intacto se torna um ato conflitivo, político. Pois, nesta fase avançada da crise isto significa engajar-se ativamente pela preservação da vida, também contra os interesses de outros; a saber, contra os interesses daqueles que tiram proveito do status quo, ou que se estabeleceram. Além disso, surge também a seguinte questão: Qual o alimento de força para as mudanças de comportamento sociais, pessoais e espirituais?

 

Uma grande missão está diante de nós. Estamos desafiados como indivíduos e em conjunto. Tantos quanto possível deveriam dar a sua contribuição. Porém, tanto como indivíduos como em conjunto somos reféns: presos em nós mesmos e nossos costumes, presos também pelas estruturas da sociedade a qual pertencemos. Onde encontramos afirmação, garantia e conselho para largar as algemas que nos prendem? Os debates atuais se esgotam muitas vezes em níveis econômico e técnico. Isso é insuficiente para moldar o futuro. Não haverá uma mudança cultural, sem uma reflexão a respeito dos objetivos, das motivações e crenças que compartilhamos para modelar as futuras formas de sociedade.

Nossa língua pode gerar imagens novas, que questionam nosso ser “de ser humano” e nosso agir antropogênico. Essas imagens não mostram de que nos queremos afastar, mas sim, qual a nossa meta e qual é a nossa causa. Precisamos de novas narrativas que falam do paraíso, da vida boa para todos. Para isso, basta implantar as imagens bíblicas na realidade e empacotar em imagens concretas: por exemplo, rios e árvores, pessoas livres e felizes em meio a um jardim como Éden ou numa verde cidade celestial-terrestre, diversas e biodiversas, pacíficas, com e sem tanga, ativas e calmas, juntos e a sós. O veículo é o anseio. A viagem volta ao início suposto e, assim, se torna a meta. A paraisofação vira uma fonte de inspiração pela qual dialogamos entre nós, mas também com Deus.

O paraíso como missão: com o conceito do paraisofação queremos resgatar as ideias bíblicas de relacionamento. Tudo será criado duas vezes: uma vez no imaginário e outra vez na implementação. A ‘paraisofação’ é a criação de uma nova palavra com a qual as imagens de Éden devem ser repensadas: O jardim Éden é um lugar na terra. A Bíblia nomeia-o concretamente: situado no Oriente, onde nasce o sol, cercado de rios e águas, com todas as espécies de plantas e uma variedade de seres vivos não-humanos. Aludindo a essa imagem, a paraisofação descreve a ideia e a consciência de que a terra é nosso único habitat dado, e que uma outra abordagem com ela – diferente da atualmente vivida – é concebível, possível e implementável.

Porém, essa ideia contém também o saber de que nem tudo está em nossas mãos; para algumas coisas temos que abrir as mãos. Deus fica de certa forma indisponível, pelo fato de que a perspectiva humana não se deixa igualar com a divina. No entanto, estamos conectados com a co-criação, que podemos identificar como irmãs e irmãos assim como fez Francisco de Assis no Cântico do Sol. Por outro lado, o tamanho de atrevimento a respeito da imagem humana em relação ao seu lugar no mundo fica evidente quando tomamos consciência da dependência da humanidade. Sem os benefícios ecológicos das plantas e animais não poderíamos existir. A extensão atual de sua destruição, porém, nos torna como seres humanos sempre mais dependentes deles e de um meio ambiente ecologicamente preservado. E para que aquilo que desejamos do meio ambiente continue funcionando, temos que nos mostrar a ele sempre mais serviçal. Com isso, também o programa de dominação se converte necessariamente.

 

CONTAR HISTÓRIAS NOVAS

 

É um ditado da razão de nos afastarmos das narrativas da submissão, do domínio e da destruição e de começarmos a contar histórias novas, baseadas na colaboração. Um dos incentivos da paraisofação é também de não reduzir o trato da terra e da vida nela apenas à autopreservação humana. Somente além da autopreservação humana e do desdobramento de poder cumprem-se o sentido e a infinidade para aqueles que buscam (e encontram) espiritualmente. 

 

Não estamos sozinhos. Em todo lugar do mundo há pessoas que desejam uma outra forma de conexão, em todo lugar há apoio. Se Deus fez com que a rede da vida surgisse, na qual nos movemos, Ele quer também, que continue nos mantendo. Pois com todas as pessoas e seres da terra estamos interligados através de fios invisíveis de dependência e influência. O Espírito de Deus nos criou fundamentalmente unidos e aliados. Portanto, o que acontece ao mundo, acontece também conosco. Virar as costas é um impulso natural considerando como a atual situação é apavorante e ameaçadora. Mas, Deus não vira as costas, Ele fala conosco através deste mundo e as Palavras dos Escritos antigos. Iremos ouvi-lo? E iremos responde-lo como os patriarcas e matriarcas, profetas e profetizas: Deus, aqui estou. Estou disposto.

 

Na história original do paraíso, a primeira pergunta que Deus faz ao homem é essa: “Onde tu estás?” Mas, Adão e Eva não respondem dizendo “Aqui estou”. Quando Deus pergunta o homem formado do barro “Onde estás?”, o mesmo responde: “Eu não tenho nada. Nada além do medo. Por isso, eu me escondo diante de Ti”. Depois, Deus fala a Eva: “Por que fizeste isso?” Mas, também ela está pouco mais corajosa do que o homem e passa a culpa a um outro ser vivo. No paraíso, ninguém quis assumir sua responsabilidade. E todos nós sabemos, aonde leva essa narrativa. Adão e Eva irão abandonar o paraíso, o lugar, onde as pessoas podem conviver com as plantas e os animais em equilíbrio.


AGIR REGIONAL E GLOBALMENTE

No entanto, segundo a Bíblia, este paraíso não é uma utopia, não é um lugar, que a gente apenas sonha: sem conflitos e como uma terra abundante para cumprir todos os nossos desejos. No macro, é uma imagem de nossa terra, e no micro, trata-se de um lugar geográfico concreto que hoje talvez esteja extremamente ameaçado. O agir regional e global devem ser conjugados e devem se relacionar. Na era em que a humanidade ultrapassa os limites dos ecossistemas globais (antropoceno, ou antropocêntrico), o imaginário bíblico do ‘paraíso’ que literalmente significa uma ‘região limitada’, não deve ser reduzida ao conceito regional.

 

Portanto, ao falar de paraisofação é justo considerar os limites da capacidade de responsabilidade e partir do local. Para que a paraisofação não se torne um conceito romântico, no qual se contemple algo distante e se esqueça as opção concretas locais, estamos paraisofazendo de verdade, quando correspondem o enraizamento regional e a abertura global. Juntos fazemos parte da criação global de Deus. Ao mesmo tempo, estamos juntos quando se trata da responsabilidade regional e do pragmatismo criativo em nível local.


QUATRO RIOS, QUATRO IMAGENS

 

O segundo capítulo da Bíblia contém uma imagem de quatro rios que circundam o jardim de Éden. De forma análoga, vemos quatro imagens que nos ajudam a tornar o mundo sempre mais um paraíso:

 

1.      Os paraísos que já estão presentes...em cada lugar e região. São aqueles paraísos que precisamos enxergar em primeiro lugar.

 

2.      Os paraísos que surgem – graças ao poder da autocura dos sistemas ecológicos quando a saída de energias fósseis for consumado. Vamos confiar nisso!

 

3.      Vamos proteger os paraísos que ainda temos! Nossos paraísos não devem acabar-se por causa da nossa falta de periculosidade. Segundo a Bíblia, os Querubins frente às portas de Éden levaram nas mãos espadas ardentes. 

 

4.      Vamos criar paraísos novos, ecologicamente e socialmente. Não devemos nos concentrar no que já existe. Deus nos criou como co-criadores. Cada recinto na Igreja pode ser tornar um pequeno jardim de Éden: oásis de biodiversidade, resgatados dos desertos de concreto de nossas cidades.    

 

Se conseguirmos isso, os paraísos dos quais cantamos, sonhamos e que vestimos em nossas camisas gastas serão diferentes: não serão mais esvaziados de conteúdo, como uma moda efêmera de consumo ou wellness. Não! Os paraísos serão a realidade de uma promessa; de uma promessa que podemos nos dar nas conversas entre nós e com Deus.

 

[escritor: Constantin Gröhn; tradução: Johannes Gierse, frade e menor]

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